quarta-feira, 23 de junho de 2010

Apagado


As qualidades ficaram comuns, banais,
o divino como cotidiano,
os defeitos cutucaram carnavais,
festas de erro humano

sobram

Quando encontrar o amor eterno
de novo
bebe, suga, esfrega no peito
a porra do amor,
pois acaba, seca, some.

Pega e come o que te consome
e não brinque com os restos,
de novo restará a fome,
reflexão de frases, fatos, gestos.

Apagou, mas foi quente,
delirante. Foi asas que me deram
pra refrescar os pés. Foi brasas
que mantêm fora do chão.
O eterno mais belo já finalizado.

Distância


Tenho uma faca cravada no peito,
correntes falsas me prendem o corpo,
na minha frente um anjo de face linda
tem correntes tão frágeis quanto as minhas.

Só o tenho em meus sonhos
que correntes não podem prender,
mas quando em sonho o toco
a faca torce meu peito sem prazer.

Amei (e talvez ainda amo)
quem me prende,
quando tento me livrar da corrente
torce a faca da culpa
range a corrente do remorso.

Quero-te, anjo, mas não te posso.
aliás, poderia agora te tocar
não fosse minha faca de sustentar
não fosse a corrente que me levanta

Beija-me, que a faca se evapora
e esqueço da corrente que outrora
beijei. Beija e me liberta do castigo
de fingir ser teu amigo, pois sozinho
não consigo.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

ser ou não ser é questão de opinião


Raiva, traição, assassinato, mau, culpa, medo, etc.
Todas essas idéias, ideais e atos fazem parte do instinto animal, ou paixões, como chama a filosofia. A TV e as religiões dizem que devemos controlar essas paixões, que não devemos matar, não devemos nos manter com raiva, nem trair, nem preferir o mau, nem errar, mas sim sentir medo, namorar, casar, ser fiel, calmo, bom, honesto. Ou seja, pedem para sermos contra nossos instintos, tratam-no como algo adverso. Ora, o instinto é tão parte do ser humano quanto a inteligência, o raciocínio, o amor, a raiva, o auto-controle. Como parte que nos compõe pode ser contra nós mesmos, ou como nós mesmos podemos ser contra parte que nos compõe?
Não abdique dos seus vícios, nem do seus erros ou "pecados". Abuse-os, pois eles são você, e você é eles. Se apaixone por cada mulher ou homem que quiser ao mesmo tempo. Sinta sua raiva sem remorso, pois sem ela você é incompleto. E não é possível ser uma coisa só. Todos são bons e maus, bi, homo e heterossexuais ao mesmo tempo, fiéis e traidores, quentes e frígidos, pedras e plumas simultaneamente.
Não seja quem te dizem para ser, nem seja você mesmo. Simplesmente seja, ou não. Ser ou não ser é questão de opinião.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Espelho quebrado


Tantos calos nos pés
por não ter os pés calados.
Andar é abrir caminho entre nuvens
e encontrar o sol.
Encontrar o sol
é tocar com o corpo
algo que a alma queria tocar.
Tantas coisas...
Aquelas pernas que
vistas por trás sugam a alma.
Quem sabe o amor está
em ver e não tocar.
Quem sabe o amor está
em amar e não viver.
Quem sabe o amor está
em amar e não estar vivo
pra saber.

As palavras dizem não,
os feromônios dizem sim.
Continua assim, distante
que despertas o amor em mim.

Meus olhos amam tua boca.
É tudo que mais quero, que mais temo.
Contenho a vontade de meus lábios
de seus lábios conquistarem,
mas que se os tenho, lábios úmidos,
a brasa, ou se esvai, ou queima
meu narciso.
E vã vida viveria
submisso.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Quase


Como se desfaz um vício?
Distrai os pensamentos,
abusa d'alma,
cega as vistas

O cérebro até dói,
mas gosta demais.
Como pensar em problemas
como esses sons tão coloridos?

Do mundo esqueço
Do amor ignoro
Da morte rio
Da vida choro

Aviso-lhe povo:
depois que vier o primeiro
haverá o de novo.

troca o que lhe é inteiro
por algo de novo
algo certeiro.

terça-feira, 30 de março de 2010

Marcha


Passo a passo
vão passando
as pessoas
por caminhos penosos.

Uns com passo firme
uns com passo frouxo
uns com peito inchado
outros usam bojo.

Mas sempre no ritmo,
ritmo da vida.
Passo, passada, pisada.
Como os pensamentos,
como vêm e vão,
como vêm em vão,
os amores.

Quem toca tambor,
toca bem também
sua teimosia:
Não mato, não morro,
mas tento acertar
a alma de tudo.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Sofá


Ver a vida através da tela.
Distante, de fora, de longe,
de onde se é invulnerável.
De lá,
de dentro do palácio do julgamento.

Ah! Doce dádiva...

quarta-feira, 24 de março de 2010

Onde


Pago minhas contas
faço minhas compras
ato minhas pontas
falo com as sombras.

Vivo de teima
morro de tédio
morte que queima
da vida o assédio.

Caos
Caos
Caos

Donde não surge
de onde mais se urge:
resposta pura
pergunta nua

crua
cura
para
sua
fúria.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Comecei do meio


Comecei do meio,
que será de mim?
Acabei com medo
de encarar o fim.

Curiosidade mata.
Mata morrer curioso.
Se o começo é mistério,
o fim é monstruoso.

Mas, se ao menos dessem
um destino à sorte,
talvez não tivesse
tal temor à morte.

terça-feira, 16 de março de 2010

Arco Íris

O arco-íris cortante rasga o céu.

Mal o vê a mulher de vermelho,
mas se vê no espelho
achando se enxergar.

Não o vê o homem sem sonhos.
Há muito mal sabia o tom do céu,
nem que o céu era todo seu.

Não o sente o guri sob o Sol.
Criança que sofre quando o verde cruel
degreda a esperança.

Não o devora o avô, que toma a vergonha azul
de um vasto arco-íris de remédio.
Agora! decide entre morrer, ou morrer de tédio.

A mulher de vermelho passa uma sombra anil
sonhando com o homem sem sonhos.
O guri sorri ao mesmo tempo que as lágrimas gritam.
O avô não decide pelo tédio, desejando que o céu seja violeta.

O arco-íris cortante rasga o céu.